26-03-2020
A revista Science publica no seu número de março um estudo levado a cabo na Gruta da Figueira Brava (Portinho da Arrábida) que revela que a pesca e a recoleção de marisco contribuíram de forma muito significativa para a economia de subsistência dos povos que a habitaram entre há 86 e 106 mil anos atrás.
Paulo Legoinha, professor e investigador do Departamento de Ciências da Terra da FCT NOVA, é um dos 21 co-autores que realizaram este trabalho, dirigido por João Zilhão, investigador do Centro de Arqueologia da Universidade de Lisboa (UNIARQ).
A gruta foi usada de forma continuada como lugar de habitação ao longo dos vinte milénios compreendidos entre há 86 e 106 mil anos — ou seja, durante o último período interglaciar, quando o clima da Terra era parecido com o actual. Os vestígios arqueológicos deixados por essas comunidades do Homem de Neandertal — cinzas, carvões e outros provas de uma utilização intensiva do fogo, utensílios em quartzo e sílex, restos alimentares — são abundantes.
Paulo Legoinha investigou a presença de foraminíferos (organismos microscópicos marinhos) nos depósitos arqueológicos da Gruta. A ocorrência destes microfósseis relaciona-se com o intervalo de nível alto eustático (MIS5e, ca. 110 mil anos), durante o qual o oceano escavou o sistema de cavernas. A ausência de foraminíferos em todas as amostras datadas do intervalo MIS 5c-MIS 5b mostra ainda que a linha da costa nunca voltou a estar suficientemente perto da gruta da Figueira Brava para que foraminíferos pudessem ser de novo introduzidos na cavidade e que não existia uma praia adjacente, mas sim uma faixa de dunas com pinhal, que separava a gruta do mar.
As conclusões deste estudo multidisciplinar refletem que a maioria dos neandertais terá vivido como os da Figueira Brava, que a familiaridade dos humanos com o mar e os seus recursos é muito mais antiga e estendida do que até agora se pensava, e que a imagem dos neandertais como gentes do frio, especializados na caça de mamutes, rinocerontes, bisontes e renas, é uma distorção criada pela história da investigação arqueológica.
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Na imprensa
“Estudo revela que neandertais europeus praticavam economia de subsistência” (Observador)